A produção de carne na Amazônia tem historicamente crescido graças à expansão de pastagens. É fácil notar uma correlação positiva entre pastagem e desmatamento: quase 85% das terras desmatadas se encontram em pastagens. Existe também correlação entre o desmatamento e as taxas de crescimento do rebanho  (ver figura) e preços de carne (ver figura). Embora muitos autores tenham destacado uma complexidade de incentivos que influenciam o desmatamento na Amazônia, à pecuária ainda se atribui uma grande responsabilidade por este desmatamento . No entanto, as causas do desmatamento são diversas e frequentemente relacionadas. Seria mais exato dizer que a geopolítica expansionista, os créditos subsidiados, a crescente demanda nacional e internacional por carne, os investimentos em infraestrutura e a eterna busca humana pela posse da terra foram fatores que contribuíram para que o desmatamento ocorresse. Lembre-se que a pecuária é a forma mais barata de se ocupar a terra desmatada e assegurar sua posse, que de outro modo estaria ameaçada. Nessa perspectiva, não seria então mais adequado pensar na pecuária mais como companheira do desmatamento, do que propriamente sua causa? Não estariam ambas sujeitas ao mesmo contexto social e econômico?

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No entanto, qualquer que seja a ótica adotada, a pecuária, como qualquer outra atividade econômica, cada vez mais será demandada para melhorar suas metas de qualidade, segurança alimentar, conservação ambiental e responsabilidade social. Nesse sentido, há uma crescente cobrança dos órgãos públicos, organizações não governamentais (ONGs), consumidores e até da própria sociedade para que as propriedades rurais e os processadores de alimentos desenvolvam atividades ambientalmente corretas, fornecendo produtos seguros para o consumo nos mercados interno e mundial.

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Além disso, as barreiras não-tarifárias impostas pelos países importadores têm forçado os países produtores a seguirem rígidas normas fitossanitárias, incluindo limites máximos de contaminação (resíduos) dos produtos vegetais e animais por agrotóxicos, medicamentos e outros químicos. A cadeia produtiva de alimentos deve também fazer uso mais eficiente dos seus insumos, de forma integrada, desenvolvendo processos e produtos mais seguros e gerenciando os recursos naturais e humanos de forma responsável para garantir a segurança alimentar do produto final. Para tanto, os países produtores têm que provar que atendem tais normas e requisitos através de certificações. Como exemplo de certificações empregadas na agropecuária brasileira, podemos citar Programa Embrapa Carne de Qualidade, EurepGAP, Programa Alimentos Seguros (PAS), Sistema Agropecuário de Produção Integrada e Sistema Agropecuário de Produção Integrada (SAPI).

Visto que a pecuária está relacionada, como causa ou não, ao desmatamento, cresce também uma pressão para que os produtores produzam com sustentabilidade ambiental. Embargos à carne brasileira, que antigamente eram decorrentes de barreiras sanitárias, atualmente consideraram o contexto ambiental, incluindo a discussão sobre desmatamento, ineficiência do uso da terra por sistemas de pecuária extensiva e emissão de gases de efeito estufa (GEEs). Por exemplo, o Brasil foi sistematicamente acusado por países pertencentes à União Europeia, particularmente pelos irlandeses, de produzir carne à custa da destruição da floresta amazônica e, consequentemente, de ser responsável pelo aquecimento global provocado pelo desmatamento e queimadas. A produção de carne passa então a ser discutida nos fóruns das commodities com responsabilidade ambiental, como nos exemplos da Mesa Redonda da Carne e Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável.

A pecuária também é responsável por aproximados 18% dos GEEs emitidos no mundo. Dentre os gases de efeito estufa produzidos pela pecuária, os mais significativos são CO2, CH4 e N2O. Grandes quantidades de GEE são provenientes do metano emitido pela fermentação entérica dos ruminantes, da queima de resíduos agrícolas, da decomposição da matéria orgânica e do uso de combustíveis fósseis. A produção de metano por bovinos é conhecida como metanogênese, onde o CH4 é produzido pelo uso de energia proveniente da dieta pelo animal e representa uma perda em eficiência alimentar. As emissões de metano pelos bovinos estão entre 2% a 12% da energia bruta ingerida.  DSC_0115

O IPCC calcula que um bovino emita em média 1,1 tonelada de CO2eq (CO2 equivalente) por ano na forma de metano entérico (1 kg de metano = 21 kg de CO2eq) (ver tabela). Consequentemente, a atividade agropecuária, com um rebanho de mais 211 milhões de cabeças, representa 37% das emissões de GEE brasileiras, atingindo um total de 446 Mt CO2eq. Logo, a Agropecuária se tornou o terceiro setor mais emissor de GEE, logo atrás do setor de Energia e Mudança no Uso da Terra.

Emissões de CH4, em gramas por dia, acumulado até abate, gramas por quilograma de peso vivo (PV) e em quilogramas por ano, ganho médio diário (GMD) e dias até abate dos animais.

 GMDDias atéEmissões de CH4   
TratamentoKg/diaAbate*g/diaAcumulado (Kg)g.CH4/kg ganho PVKg ano
Pasto Adubado**0,4776689,968,819132,8
Não Adubado**0,3120092,811130933,9
iLP1***0,4678311287,624340,9
iLPF1***0,467838868,919132,1
iLP6***0,3310919710629435,4
* Peso vivo ao abate = 540 kg, ** Bioma Amazônico. iLP1 – integração lavoura-pecuária com pastagem de um ano de formação, *** Bioma Cerrado, iLPF1 – integração lavoura-pecuária-floresta com pastagem de um ano de formação, iLP6 – integração lavoura-pecuária com pastagem de seis anos de formação.

Na pecuária, a produtividade animal se relaciona com o consumo alimentar e eficiência de ganho de peso vivo, gerando emissões de metano entérico variadas. O baixo índice produtivo da pecuária de corte se torna o grande problema na emissão de GEEs, pois é o metano produzido por animais com baixas taxas de ganho de peso (ou perdendo peso na seca) e por vacas vazias ou por novilhas que entraram tarde na reprodução, que aumenta a relação entre a produção de metano por quilograma de carne ou de leite produzido. E isto pode ser agravado, pois um aumento de temperatura da ordem de 3°C (aumento médio previsto pelo IPCC até 2100) poderá causar a perda de até 25% da capacidade de suporte das pastagens para bovinos de corte, o que equivaleria a um aumento de custo de produção de 20% a 45%. Essa perda de área deve ocorrer principalmente por causa do aumento de 30 a 50 dias do período sazonal de seca nas áreas hoje aptas para pastagens. Todos esses fatores reforçam a necessidade pela busca de sistemas mais eficientes e adaptados ao novo cenário climático mundial.

Diversas estratégias podem ajudar a mitigar a emissão de metano, como a melhoria da dieta, incluindo aumento de concentrado volumoso, inclusão de lipídios e uso de aditivos protéicos, além do uso de aditivos alimentares (antimicrobianos, óleos essenciais, probióticos, entre outros) que promovam eficiência metabólica. A título de ilustração, bovinos de corte criados em pasto, em sistemas de integração lavoura/pecuária, e posteriormente terminados em confinamento, emitiram em média 40,3 kg de metano/cabeça/ano, durante três anos de período experimental, indicando que os animais com maiores ganhos diários de peso podem emitir menores quantidades do gás.

Uma outra alternativa é a redução do rebanho, mantendo o mesmo nível de produtividade. O aumento de produtividade pode ser alcançado pela adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (iLPF) como forma de obter uma maior quantidade de produtos em uma mesma área. Nesse aspecto, sistemas de produção integrados como a iLPF apresentam grande potencial para intensificação da produção pecuária, proporcionando ganhos produtivos, econômicos e ambientais. Estudos sobre ecossistemas de pastagens nos biomas da Amazônia, do Cerrado e da Mata Atlântica, considerando os estoques de carbono no solo em comparação à vegetação nativa, indicam que, de modo geral, solos sob pastagens bem manejadas em sistemas de integração lavoura/pecuária acumulam carbono em níveis semelhantes ou superiores à vegetação nativa. Por outro lado, a degradação das pastagens promove perda do carbono acumulado.

No entanto, a maioria da pecuária brasileira continua abaixo de suas reais potencialidades, mantendo um sistema tradicional extensivo de baixa taxa de lotação (< 1 UA/ha) e produtividade (< 120 kg de peso vivo ou 4 arrobas/ha/ano). Como visto, o aumento histórico da produção foi obtido através da expansão das novas áreas de pastagens no lugar de áreas de matas e florestas, com grande impacto ambiental. Portanto, estratégias que permitam aumentar a taxa de lotação, fertilidade do rebanho, o ganho médio diário, o peso da carcaça e o retorno financeiro por área, são hoje necessárias para acomodar o crescimento da pecuária sem novos desmatamentos.