Analisamos a rastreabilidade da cadeia de suprimentos de soja e carne bovina, vinculando explicitamente o desmatamento potencialmente ilegal em propriedades rurais à sua produção agrícola e posterior exportação da região para países da União Europeia. Para isso, compilamos bases de dados sobre o uso da terra e desmatamento, informações sobre os limites de 815 mil propriedades rurais do CAR e dados de exportação de soja e carne bovina.
Para o cálculo do balanço do Código Florestal (CF), são quantificadas a área total da propriedade rural, a área total da vegetação nativa e a área agrícola total em 2008 (também denominada área consolidada). Quando há a ocorrência de cursos e corpos d’água, o modelo gera buffers de largura mínima da APP necessária para a conservação e a restauração florestal de acordo com as regras do CF (Brasil 2012, Soares-Filho et al. 2014). Em seguida, a reserva legal (RL) é calculada como um proporção da área da propriedade (80% no bioma Amazônia, 35% nas áreas de Cerrado na Amazônia Legal e 20% nos demais biomas) (Art. 12, I). Para calcular a RL a ser restaurada, incluímos os valores de módulo fiscal (MF) e a área total de áreas protegidas por município de acordo com o CF.
A estrutura sequencial para obtenção do balanço do CF pode ser observada na figura abaixo. Definimos um resultado positivo como excedente ambiental (ativo) e resultado negativo como débito ambiental (passivo). Veja a figura abaixo.
Nosso modelo estima o balanço do CF utilizando um mapa de uso da terra que integra (i) massas de água; (ii) rios e cursos de água; (iii) áreas consolidadas em 2008; (iv) floresta; e (v) não floresta. Assim, no lugar de usar dados sobre vegetação nativa, APP, RL e áreas convertidas das declarações CAR, nossa abordagem faz uso de uma base de dados de acesso aberto.
Para conectar o nível de conformidade ambiental e o desmatamento potencialmente legal e ilegal às cadeias de fornecimento de soja e carne bovina, construímos um banco de dados espacial combinando o balanço do CF, o desmatamento, as áreas de cultivo de soja, as licenças de autorização de desmatamento, as áreas embargadas por propriedade e os documentos de Guia de Trânsito Animal (GTA) (figura abaixo). O banco de dados permite realizar consultas visando descortinar toda a cadeia produtiva da soja e da carne em conjunto com a estimativa das exportações dessas commodities para a União Europeia.
Comparamos nossos resultados com os dos modelos analíticos do Código Florestal desenvolvidos pelo IPAM e IMAFLORA. O estudo de comparação entre UFMG, IPAM e IMAFLORA objetivou primeiramente chegar a um entendimento comum da lei, logo em um modelo lógico comum. No entanto, cada equipe desenvolveu sua própria implementação. Para tanto, as três instituições analisaram municípios selecionados da Amazônia e do Cerrado no estado do Mato Grosso usando uma base de dados comum.
Para mais informações acesse o material suplementar.
Para estimar a quantidade de soja contaminada com desmatamento potencialmente ilegal, primeiro identificamos o percentual de área de soja plantada em propriedades com desmatamento potencialmente ilegal em relação ao total de soja plantada por município, obtendo-se, assim, um percentual de contaminação municipal (figura abaixo). Em seguida, aplicamos este percentual aos dados de exportação municipal de soja para a UE (TRASE 2018).
Para estimar o número de cabeças de gado contaminadas com desmatamento potencialmente ilegal, analisamos os registros de bovinos dos estados do Pará e Mato Grosso da base. Com isso, rastreamos os fornecedores diretos e indiretos de gado, ou seja, operações intermediárias de cria e recria antes que o gado seja enviado para fazendas que engordam e vendem diretamente para frigoríficos e abatedouros. Para calcular as exportações de carne potencialmente contaminadas, calculamos para cada município, a relação entre o total de bovinos contaminados (diretos e indiretos) e o total de cabeças comercializadas. Em seguida, aplicamos esse índice de contaminação por município às exportações de carne bovina para a União Europeia (TRASE 2018).