O projeto da ferrovia EF-170, conhecida como Ferrogrão, é uma obra prioritária do atual governo para reduzir os custos do transporte de commodities e com isso aumentar a competitividade da produção no meio oeste. Entretanto, o projeto é marcado por controvérsias quanto à sua viabilidade econômica e potenciais impactos socioambientais que extrapolam em muito a área de apenas 10 km no seu entrono como analisada nos estudos de viabilidade da obra.

Em um policy brief, pesquisadores do Centro de Sensoriamento Remoto (CSR) e do Laboratório de Gestão de Serviços Socioambientais (LAGESA) da UFMG alertam que a construção da ferrovia com o terminal de carga em Matupá irá desencadear uma cadeia de eventos que partirá ao meio as terras indígenas do Xingu e Capoto-Jarina, gerando grandes impactos socioambientais e econômicos.

No estudo são analisados três cenários usando-se o modelo OtimizaINFRA, que simula a logística de transportes no Brasil. Estes cenários são o atual; o da implantação da Ferrogrão com apenas dois terminais em Sinop/MT e Miritituba/PA; e o da implantação da ferrovia com a inclusão do terminal em Matupá mais intervenções na MT-322 que corta a terra indígena Capoto-Jarina, incluindo asfaltamento e construção de uma ponte sobre o rio Xingu.

Atualmente, a travessia do rio é feita por uma balsa controlada pelos Kayapós. Após a chamada “guerra da balsa” em 1984, eles conseguiram a demarcação do seu território como Terra Indígena (TI) Capoto-Jarina e passaram a controlar a travessia, cobrando uma tarifa de todos os não-indígenas.

Com construção da ponte, as associações indígenas afirmam que perderão o controle sobre o acesso de terceiros aos seus territórios, o que levará ao aumento descontrolado do fluxo de veículos na estrada e de pressões para grilagem de suas terras. Segundo o estudo, enquanto hoje, não há registro de movimentação de soja pela MT-322 mudanças previstas no cenário que inclui essas intervenções resultariam no tráfego de 174 caminhões de soja por dia ou 1,9 milhões de toneladas por ano através dos territórios indígenas do Parque do Xingu e Capoto-Jarina. Esse intenso fluxo de veículos não apenas aumentaria a pressão para a conversão de florestas para a agricultura por toda região, como também aceleraria a invasão e desmatamento dentro dos territórios indígenas da região.

Os pesquisadores estimam que 230 mil hectares poderão ser desmatados nas terras indígenas do leste do Mato Grosso até 2050 sob um cenário de fraca governança ambiental, como o atual. E de todo esse desmatamento, mais da metade ocorreria somente no Parque Indígena do Xingu. Fora isso, a perda de floresta dentro da bacia logística da Ferrogrão no Mato Grosso atingiria 65% até 2035.Como resultado, as perdas econômicas decorrentes de emissões de CO2 pelo desmatamento figurariam no patamar de US$ 1 bilhão (US$ 10/ton CO2). Haveria também mais redução do volume anual de chuvas, que em algumas regiões já chega a 48% atualmente, acarretando na queda da produtividade agrícola e da geração de energia de Belo Monte, que se reduziria a 25% do máximo de sua capacidade. Isso sem contar a perda incalculável dos serviços ambientais e da sociobiodiversidade da região.

Por isso, os pesquisadores defendem que qualquer análise de impacto ambiental da Ferrogrão deva considerar toda a zona de influência do empreendimento, e não apenas os 10 km analisados até então. Logo, os impactos socioambientais e econômicos em toda sua extensão devem ser contabilizados na análise de viabilidade do empreendimento e de seu potencial retorno para a sociedade.

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