ESTUDO INOVADOR DESENVOLVIDO PELA UFMG E UFV DEFINE ÁREAS PRIORITÁRIAS PARA RESTAURAÇÃO AMBIENTAL NO MAIOR PROGRAMA DE REFLORESTAMENTO DE BACIA HIDROGRÁFICA JÁ REALIZADO NO BRASIL

Em 2015, no município de Mariana, desencadeou-se o maior desastre ambiental ocorrido no Brasil quando a barragem de Fundão, empreendimento da mineradora Samarco, rompeu-se despejando cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeito de minério no rio Gualaxo do Norte. Os rejeitos atingiram o rio Doce trazendo um prejuízo ambiental imensurável.

Como forma de mitigar os impactos causados, a Fundação Renova, que é fruto da assinatura do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) entre Samarco, com o apoio de suas acionistas, Vale e BHP Billiton, e o Governo Federal, os Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo e diversos órgãos, assumiu o compromisso de fornecer R$ 1,1 bilhão para a recuperação de 40 mil hectares de floresta na bacia do rio Doce ao longo de 10 anos. Este é um dos maiores programas de restauro florestal já realizados em uma bacia hidrográfica no Brasil e no mundo.

No intuito de definir sob bases científicas sólidas quais áreas da bacia deveriam receber os esforços de recuperação ambiental, foi firmado um convênio entre a Fundação Renova, a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade Federal de Viçosa.

“Como não há em curso um projeto de restauração desta magnitude em propriedades privadas, a Fundação Renova precisou buscar uma solução inédita, que resultou na assinatura do seu primeiro convênio. Outro desafio grande foi a necessidade de integração das duas grandes universidades brasileiras que estão conosco nesta importante entrega”, explica Lucas Scarascia, líder de programa socioambiental da Renova.

“Não se trata de um contrato no qual as universidades receberam dinheiro pela entrega de um produto, mas sim de um convênio onde ambas as partes envolvidas tinham seus objetivos, individuais e mútuos, e assim trabalharam de modo a buscar na ciência as respostas para um problema real, com aplicação prática”, destaca o professor Raoni Rajão, coordenador do projeto na UFMG.

O projeto foi coordenado, ainda, pelos professores Silvio Bueno Pereira (in memoriam) e José Ambrósio Ferreira Neto, da UFV, envolvendo pesquisadores do Laboratório de Gestão de Serviços Ambientais (LAGESA/UFMG), do Centro de Sensoriamento Remoto (CSR/UFMG), e dos departamentos de Engenharia Agrícola e de Economia Rural (UFV).

 

Novas metodologias

O trabalho foi particionado em duas etapas. Primeiramente foram mapeadas as áreas prioritárias para a recuperação ambiental da bacia do rio Doce. Para isto foram agregados dados ambientais, sociais e econômicos no intuito de gerar mapas que revelam os índices de vulnerabilidade ambiental, social e a vocação para a restauração na bacia. Segundo Rajão, “esta é uma metodologia inovadora, uma vez que considera não apenas a degradação de uma área, mas também sua vocação para o reflorestamento, ou seja, a aptidão para receber e multiplicar com sucesso o esforço de restauração”.

Metodologia de classificação das áreas prioritárias para regeneração natural, reflorestamento e implantação de sistemas agroflorestais.

Considerou-se, ainda, diferentes modalidades de restauração conforme a vocação para uso da terra, como a possibilidade de plantio de espécies nativas, a implantação de sistemas agroflorestais, nos quais haveria exploração econômica em consonância com os preceitos legais, e a regeneração natural em locais nos quais a vegetação pode recompor-se com o mínimo de intervenção humana. “Dessa forma foi possível delimitar as áreas da bacia em que há interseção entre características de pronunciada vulnerabilidade social, degradação ambiental e maior possibilidade de sucesso na implantação de medidas de restauração ambiental”, ressalta Rajão.

Na etapa seguinte, foi elaborada uma proposta técnica de escalonamento da recuperação ambiental da bacia, por meio de um cronograma anual detalhado das etapas da restauração. “Com o mapa de priorização e com critérios de escalonamento à mão, buscamos definir a logística operacional do programa de recuperação ambiental, estabelecendo as áreas alvos ao longo do tempo de implantação do programa”, explica Rajão.

 

A ciência como norteadora de políticas públicas e privadas

As etapas de desenvolvimento do projeto foram discutidas em sessões com órgãos governamentais e comitês de bacia hidrográfica, nas quais se estabeleceu um cenário de governança complexo, consolidando as áreas alvo da recuperação ambiental por meio de bases científicas e da prática de outras instituições.

“Um rico estudo de priorização de áreas foi entregue para a Câmara Técnica Restauração Florestal e Produção de Água (CT-FLOR), que analisou, validou e encaminhou para o Comitê Interfederativo (CIF), que aprovou a nota técnica da CT-FLOR.  O estudo foi apresentado para a sociedade em cinco oficinas com 400 participantes, que foram articuladas em conjunto com a CT-FLOR e o Comitê de Bacias do Rio Doce (CBH-Doce). Alguns ajustes finos poderão ser feitos, no momento da implantação, de acordo com os apontamentos dos produtores rurais atingidos”, completa Scarascia.

Para Rajão, o projeto trouxe ganhos importantes tanto à academia, com o desenvolvimento de novas metodologias de análise ambiental, quanto à sociedade, ao considerar o aspecto de aptidão das localidades para a restauração. “Alcançamos um novo patamar científico na definição de áreas de restauração quando incorporamos à análise fatores sociais como a geração de renda por meio de diferentes modalidades de reflorestamento conforme a vocação de cada região.”

O próximo passo compreende a aplicação das normativas estabelecidas através do projeto, vislumbrando um novo rumo para a melhoria da qualidade hídrica e ambiental da bacia do rio Doce.

Oficinas realizadas junto a órgãos públicos e população civil.